segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Fala, mestre!

Em entrevista cedida por Márcia Valéria Soares, 57, professora desde 1970, debate sobre a questão educacional atual, o choque entre epócas e a sugestão para um futuro melhor.


MG - O que a motivou a ser uma educadora?
MVS - Vocação. Desde criança brincava de escolinha e sempre tive paciência para ensinar. Na hora de escolher tudo transcorreu naturalmente. Fiz primeiro o curso de Letras e depois, o de Pedagogia.


MG - Como era o sistema educacional brasileiro na década de 70? E o que é a educação no panorama atual?
MVS - O mundo mudou. As informações, hoje, chegam das mais diferentes fontes: internet, televisão, outdoors, cinema, tv a cabo, enfim, é difícil comparar o que acontecia em 70 na sala de aula com o que ocorre hoje. O professor era a maior fonte de informação e todo conhecimento passava por ele. Havia maior respeito, consideração, admiração pela figura do mestre. Antigamente a estrutura familiar cumpria seu papel de formação, a escola só continuava esta formação. Hoje em dia a própria estrutura familiar modificou, suprimindo muitas vezes a formação que deveria ser dada por ela. E a escola ficou com mais esse ônus, de dar a educação que os pais muitas vezes não podem dar, ou não querem, ou não sabem.


MG - É constatado por dados, que muitos professores de redes públicas de ensino têm entrado em depressão devido à realidade educacional e à resistência dos alunos em aprender. Qual a opinião de um mestre sobre esse novo problema em sala?
MVS - A política educacional em nosso país precisa mostrar os dados de aprovação em massa para o FMI para conseguir recursos. Assim, alunos que muitas vezes não estão aptos a cursar uma série mais adiantada são aprovados. Os professores têm que seguir as regras impostas por estes profissionais da política educacional. Para apoiar esta aprovação em massa, sociólogos, psicólogos, administradores de empresa, enfim, gente que nunca entrou em uma sala de aula para ensinar começou a escrever como deveria ser a atitude do professor na classe. De uma forma muito sutil, tudo foi preparado para culpar o professor por qualquer derrota do aluno. A pressão foi ficando cada vez maior: famílias desestruturadas, Estado pobre, profissionais de outros setores interferindo na educação, salários defasados, alunos sem nenhuma capacidade de concentração e desmotivados. Todos estes fatores acabaram por desmotivar os professores, levando-os à depressão e a abandonar o magistério.


MG - Na sua opinião qual a solução para a educação brasileira?
MVS - Em primeiro lugar parar de se copiar soluções que deram certo na Espanha, Portugal, Argentina e criar soluções a partir da nossa realidade. Proibir qualquer profissional de outra área de dar palpite na área pedagógica. Priorizar a formação de hábitos e atitudes que reforcem os valores humanos, dando maior ênfase à formação. Período integral em todas as escolas para evitar que as crianças fiquem na rua. Fazer com que os alunos pratiquem mais esportes e aprendam música, para aprimorar o físico e a alma.


MG - O que é educação para você?
MVS - É a formação integral do indivíduo, qualificando-o para o exercício da cidadania, tornando-o apto a viver na família e na sociedade como um ser produtivo.


MG - E a questão da violência, das ameaças freqüentes de alunos a professores. Como controlar esta prepotência, esta falta de respeito? Cabe à escola ou aos pais?
MVS - Cabe à sociedade de uma forma geral. Aos políticos, aos legisladores, aos pais que não souberam orientar seus filhos, e, principalmente, aos responsáveis pela legislação que regulamenta a educação.


Por Maria Gabriela Dias Leite.
(entrevista e texto)

2 comentários:

Bruna Gonçales disse...

A correlação entre pontos variados de discussão social sempre se interceptam em um quesito: EDUCAÇÃO.
É constrangedor ver que, muitas vezes, a sociedade em geral não enxerga essa similaridade em todos os casos desastrosos que assolam nosso país.

Na entrevista o ponto mais esclarecedor dessa semelhança em todos os problemas é quando a educadora Márcia Valéria Soares atenta para o caos que torna-se a vida pedagógica ao ser definida pelos interesses mercantis.

Fica no ar a idéia: Onde queremos chegar? Qual o objetivo do progresso?

A sociedade do futuro está em formação. E ela ainda é (e será) dividida entre patrões e empregados, entre pobres e ricos, entre quem pode e quem suporta.

Parabéns, Brasil!
Formador número 01 da desigualdade escancarada.

Unknown disse...

A EDUCAÇÃO é o berço de uma sociedade e a família é a sua célula, a qual esta se dissolvendo.

Nos tempos que correm as pessoas casam-se por amor, mas muitas já não encaram o casamento como sendo para toda a vida. Outros, prevendo um amor de curta duração, optam por nem casar. Este tipo de amor, efémero, que considero apenas carnal, ignora muitas vezes a necessidade de proteger e acompanhar os filhos, os quais, muitos deles, desde pequeninos se vão dividindo entre a casa do pai e a da mãe, sendo obrigados a adaptar-se a novas tentativas dos pais para refazerem as suas vidas, e por sua vez acabam sendo "abandonando" nas escolas, na expectativa de conseguirem certos valores educacionais, o que muitas vezes é "raro" a sua maioria é desregrado, e sem medida, tornando-se um cidadão sem objetivos concretos.

A sociedade futura ficará cada vez mais à mercê dos ricos e dos que mais suportam, igualmente a lei da vida, o mais forte sobrevive.